Atribui-se ao escritor argentino Luiz
Borges a seguinte afirmação: “o futebol é universal porque a estupidez humana é
universal”. Não posso confirmar a veracidade, mas gostei da frase. Talvez, por
isso mesmo, por comportar a estupidez humana, o futebol seja o mais inquietante
e humano dos esportes. De fato, toda bola suja, pelada e descalça de campinho
de quintal carrega uma teoria redondinha do universo. Para Pascal "O
Universo é uma esfera infinita cujo centro está em toda parte e a
circunferência em parte nenhuma.” Lendo a afirmação de Borges pelo avesso,
chega-se a que a estupidez humana é universal e infinita como uma bola de futebol.
“É milenar, é milenar, a invenção do
futebol” diz o samba da Beija-Flor de Nilópolis. A antiguidade da invenção
talvez tenha deixado a impressão em Borges de que estupidez humana tenha
nascido com o futebol. Desconfio, no entanto, que esta seja anterior ao próprio
homem. Um atributo da vida, da biologia. O homem nasce mesmo é com o futebol. O
futebol é apenas tão redondamente estúpido, antigo e universal quanto o homem
humano de cada um de nós. “Nonada. O diabo não há! É o que eu digo, se for...
Existe é o homem humano. Travessia ”(Guimarães Rosa).
Se precisássemos personalizar a estupidez
do futebol, encontraríamos no árbitro a figura perfeita. Que milionário se
prestaria a ser xingado por uma multidão, embaixo de sol a pino, metendo-se
voluntariamente numa disputa apaixonada entre duas nações? O senhor Jonas
Eriksson, árbitro sueco da partida Brasil x Camarões. A máxima nietzsheana "não
existem fatos, apenas interpretações" deveria ser o lema dos árbitros,
esses paradigmas da estupidez humana. Tudo pelo poder. Na trama da disputa é
dos “senhores de preto” o poder supremo da interpretação, da construção da
verdade. Tornamo-nos súditos no reinado do apito. Curvados perante reis de
Suécia, de Espanha, ou da Cochinchina, aceitamos com resignação “erros"
(interpretações) que muito nos desagradam.
Acontece que, apesar de todo poder, os
árbitros continuam estupidamente humanos. Simplesmente, não enxergam direito.
As câmeras veem tudo, os árbitros não. Comete-se o zotismo de compará-los. Câmeras,
contudo, só servem aos críticos. É coisa para depois do espetáculo. Na boca da
cena, o poder do apito continua absoluto. Alguns jogadores conhecem bem a
cegueira destes senhores e dela se utilizam. No jogo contra a Colômbia o jogador
colombiano fez um golpe de luta livre parecer um acidente de trabalho. Não pretendemos
demonizar o jogador colombiano. Há quem diga que a entrada com o joelho na
coluna vertebral de Neymar foi apenas para fazer a falta, matar a jogada. Mas é
preciso saber distinguir entre estupidez e violência. Presumir um lance desse
como normal é substituir a primeira pela segunda. O árbitro está ali para
preservar a poesia do futebol, a integridade dos craques, com tudo o que esses
seres têm de parvos.
A violência não pode ser acolhida no
futebol com cordialidade. Seria a intromissão da estupidez da vida real na
estupidez do esporte. Não podemos aceitar que a violência invada sorrateira
este setor sublime da cultura, suporte da estupidez humana. Se matarmos o craque
(ainda que metaforicamente), choraremos como carpideiras no velório da poesia. Mais
do que punir o jogador colombiano é preciso medidas para coibir esse tipo de
entrada, como se fez com o carrinho por trás.
Definitivamente, não só o time da
Espanha abdicou de seu reinado na Copa. O árbitro espanhol também esqueceu as
cores de sua bandeira e nelas os cartões. Uma estupidez!!!
Nenhum comentário:
Postar um comentário