domingo, 3 de abril de 2016

A verdade açoitada esperneia
Uma breve análise da "operação carbono 14" revela muito do que tem de graxa, de óleo queimado no ambiente da Lava Jato. Contradições, uso de depoimentos inconsistentes, parcialidade, ilegalidades, desrespeito ao Supremo. A bela fachada de limpadora ética parece camuflar uma velha usina atômica de fatos políticos. Sempre pronta a disparar operações mísseis com objetivos políticos e midiáticos cirúrgicos, mas que afeta todo o país. Dá a sensação de estarmos num filme de suspense transfigurado aos poucos em filme de terror. Assim, municiada por essa usina de fatos manipulados, parte da imprensa apressa-se em construir narrativas que transformem ilações e suspeitas em crimes escabrosos, desde que neles estejam envolvidos determinados personagens de um certo espectro político.
Entretanto, basta uma análise detida do noticiário impresso cotejado com informações levantadas em alguns sites para que se revele a sujeira residual própria de Lava Jatos. Algumas informações pouco divulgadas sobre a operação carbono 14 podem nos ajudar:
1) A operação "carbono 14" foi deflagrada poucas horas após a decisão do STF de que o juiz Moro devesse remeter casos conexos à Lava Jato ao Supremo (instância que decide sobre desmembramento de investigações) e antes que recebesse ofício com determinação para seu cumprimento, exatamente para criar fato consumado e transferir ao STF o constrangimento de julgá-lo.
2) O depoimento de Marcos Valério, cuja proposta de delação apresentada em janeiro de 2016 por seus advogados não foi aceita por causa do descrédito de delator, agora serve como base das acusações. O depoimento é o mesmo realizado em 2012 e agora serve à Lava Jato como base jurídica na operação Carbono 14 (como confirma a manchete do G1 "Moro ressuscita depoimento de Valério na decisão da Carbono 14"). Por que só esta semana e, justamente, um dia depois das manifestações pela democracia?
3) Com base em frágeis depoimentos como esse, hoje a Folha traz uma reportagem intitulada "Operação lava jato relaciona petrolão a caso Celso Daniel" (pag. A4) em que aponta como indício de tal ligação o depoimento do Lobista Fernando Moura que "afirmou ter sido informado" que Silvio Pereira recebia um "cala-boca" da OAS e da UTC de 50 mil 'em dinheiro vivo'. A reportagem conclui: "Ele não deu detalhes da frequência nem identificou a origem da informação". Pasmem!
4) Baseados, portanto, nisso e numa conclusão, no mínimo, leviana do juiz Sérgio Moro de ser "possível" haver "alguma ligação" entre a morte de Celso Daniel e a Lava Jato (sem explicar como e por que), a Folha de SP, Estadão e Veja construíram as seguintes manchetes:
"Prisões na lava jato ligam o petrolão ao caso Celso Daniel" - Folha de SP
"Nova operação liga Lava Jato a mensalão e caso Celso Daniel - Estadão
"Um cadáver na Lava Jato" - Veja
A íntegra do despacho de Moro demonstra a leviandade da suspeita. Ele afirma: "É ainda possível que este esquema criminoso tenha alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então prefeito de Santo André, Celso Daniel, o que é ainda mais grave. Se confirmado o depoimento de Marcos Valério [de 2012] de que os valores lhe foram destinados em extorsão(...)
5) Desde 2002, o caso polêmico de Celso Daniel foi amplamente investigado pela polícia de SP, estado governado pelo PSDB há vinte anos. Dessa forma, não se discute, simplesmente, o fato de o juiz Moro suspeitar de tudo, inclusive, da investigação da polícia de SP. Mas contesta-se ideia de que bastou entrar na Lava Jato para que a justiça prevaleça, a verdade apareça. Sem que se discuta o quanto ambas foram acoitadas para que se chegasse a esse juízo de justiçamento.Surpreende que o caso polêmico de Celso Daniel encontre novo e rápido desfecho exatamente de acordo com o imaginário antipetista construíra, tomando-se a hipótese de uma "possível ligação" como verdade revelada. Ademais, trata-se como irrelevantes as circunstâncias suspeitas em que Moro transporta o caso para o âmbito da Lava Jato e lhe dá publicidade imediata. Suspeitas tão grandes quanto os vazamentos na Veja durante a campanha presidencial de 2014, a condução coercitiva de Lula e de outros cidadãos e a divulgação ilegal dos grampos, além de outras apontadas ao longo de todo o processo. (Veja http://noticias.uol.com.br/…/documentos-indicam-grampo-ileg…)
6) Não tenho procuração para defender o Lula nem o PT. O caso é pessoal mesmo. Me diz respeito. Recuso-me a aceitar ataques tão frontais ao que nos resta de liberdade de informação e de reflexão.

Um comentário:

Marcelino disse...

Análise certeira e discernimento político louvável. Parabéns. Esse texto está publicado na imprensa convencional? Se não, pense em publicá-lo nos jornais maranhenses. O público merece.